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Produtora cultural, aprendiz de escritora e fotógrafa, devoradora de livros e chocolates, "fazedora" e mantenedora de amigos.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Um trechinho de meu filhote...

Comecei a escrever este livro em uma de minhas grandes noites de insônia criativa, e estou em um momento de finalização desta história que me tomou e me envolveu de tal forma que tomou vida própria e cria sozinha seus próprios caminhos... aqui e agora, para quem quizer, o insight desta pequena grande história...

A BRUXA DA CASA AO LADO

Capítulo I – A Rua

Sempre brinquei muito na rua, e a rua da minha casa era especialmente divertida.
Éramos alguns grandes amigos e aprontávamos todas no meu quintal. Árvores viravam navios piratas, e com ele viajávamos o mundo, com a vantagem de ter sempre uma goiaba para matar a fome entre uma tormenta e outra. Moitas viravam florestas profundas, de onde resgatávamos das garras de tribos canibais, amigos que haviam se tornado reféns ao procurar um tesouro perdido. Um bambuzal virava um labirinto que nos levaria a lugares fantásticos, cheios de árvores de marshmalow e lagoas de chocolate, com pedrinhas crocantes e espuma de morango.
Estávamos sempre envoltos em muitas aventuras e sensações. O cheiro de uma mimosa[1], o gosto azedo e delicioso dos morangos que colhíamos ainda verdes, o ploct de uma jabuticaba muito preta, os vários tombos e arranhões que as árvores e pedras nos proporcionavam, a maciez das folhas e a aspereza das árvores, o cheiro de terra molhada, o calor de um dia de verão e o frescor do orvalho, isso tudo nos preenchia e instigava.
E havia ainda a rua. Ah, a rua era mágica. Estreita e toda florida. Cheia de árvores, de onde colhíamos mangas, carambolas e jabuticabas. E pulávamos corda, jogávamos bola, queimada, bete-ombro[2] e brincávamos de esconde-esconde e pique-pega.

E ali bem pertinho morava A BRUXA DA CASA AO LADO. Era uma casa de madeira, muito velha, pequena e com a pintura descascando, as janelas, também de Madeira, eram azuis, assim como a estreita porta da frente. Do telhado saía uma pequena chaminé que parecia estar sempre a soltar uma fumaça preta e com cheiro estranho. No jardim, havia algumas flores desbotadas, roseiras mal cuidadas com algumas poucas flores vermelhas e brancas com muitos espinhos, parecendo despetaladas. Havia também duas árvores quase secas, com apenas uma ou duas folhas quase verdes, penduradas em seus galhos. Confesso que gostava delas, as achava bonitas assim, retorcidas e certamente com muitos anos de vida, imaginava quantas pipas já haviam se prendido em seus galhos e se algum dia já haviam sido frondosas, verdes e mais vivas.
A bruxa, a gente quase não via. Sabíamos apenas, que tinha uma horta e vendia temperos para nossas mães. Uma ou duas vezes tive eu mesma que ir comprar uns para a minha, com um medo que nem sei como descrever. Só a víamos nestes dias e quando saia para comprar alguma coisa, o que não acontecia muito. Sempre com aquele andar vacilante e um xale verde nas costas, estivesse frio ou não, e com sua sacola vermelha que, desconfiávamos, carregava os ingredientes para seus feitiços.
Volta e meia caía uma bola ou uma pipa nossa em seu quintal, mas tínhamos medo de pegar de volta e a brincadeira acabava por ali. Sempre me perguntei o que acontecia com aquelas coisas perdidas, pois não as víamos mais no quintal e nem a víamos pegá-las. Era um grande mistério para nós, assim como seu nome: nunca soubemos. Minha mãe a chamava de Dona Coisinha e não me lembro de ter ouvido alguém chamá-la de outro nome.
Isso até aquele dia.
Eu voltava da escola, como sempre, pelos trilhos da ferrovia, catando pedrinhas e jogando no córrego que passava ao lado.
Assim, meio andando, meio saltitando – era assim que eu andava – seguia meu caminho até que, quase em casa, esbarrei com a Dona Coisinha. Dei um pulo pra trás, tropecei e quase caí no córrego. Ela me fez uma careta, o que me deu mais medo ainda e veio em minha direção. Meu coração parecia sair pela boca e quase não consegui me mexer do lugar. Então ainda com a careta ela me estendeu sua mão e me ajudou a ficar de pé. Só então percebi que a careta era um sorriso – era como ela sabia sorrir – mas ainda desconfiada esperei-a dizer alguma coisa.
- Olá minha filha, será que você pode me fazer um favor? - Disse ela
- Ahnhã! - Foi só o que consegui dizer


[1] Conhecida como mexerica e tangerina em outros lugares do Brasil, chama-se mimosa no sul do país.
[2] Tipo de jogo onde jogam quatro jogadores, que formam dois times de dois. Cada time possui uma casinha feita com três gravetos equilibrados e um taco, e os participantes se revezam como lançadores atrás do rebatedor adversário ou rebatendo a bola. O objetivo é derrubar a casinha do adversário, lançando a bola diretamente para ela, acertando-a ou pegando a bola que foi rebatida pelo adversário, e acertando-a, antes que ele complete, correndo, ida e volta entre as casinhas.
- Olá minha filha, será que você pode me fazer uma gentileza? - Disse ela

- Ah, hã! - Foi só o que consegui dizer

3 comentários:

Unknown disse...

Me deu vontade de ler tudinho....e agora.......?Como vou conseguir?

Mariana Pietrobon disse...

Calma... logo, logo, este ano ainda, o livro todinho será lançado e vc terá a chance de ler todo o resto. Que bom que gostou!!! Fico feliz.

Eduardo Lara Resende disse...

Gostei do blog, Mariana... Dos textos. Muito bom o texto em que V. se apresenta ("Eu"). Imagem rica, bonita, a do sorriso de Dona Coisinha, que o medo mostrava a V. como careta. Vá em frente!
Abraço.